segunda-feira, 15 de junho de 2009

A MISSA E A MORTE III

Reparação

Outro fim do sacrifício é a reparação da ofensa feita a Deus pelo pecado, e a expiação da pena devida ao pecado. Devemos fazer de nossa morte um sacrifício propiciatório: a adoração dever ser, a bem dizer, reparadora.
Nosso Senhor expiou superabundantemente nossas faltas, porque – diz Santo Tomás (IIIª q. 48, a. 2) – ao oferecer Sua vida por nós, fizera um ato de amor que agradava mais a Deus do que O aborrecia todos os nossos pecados reunidos. Sua caridade foi muito maior que a malícia dos algozes; possuía um valor infinito tirado da personalidade do Verbo.
Ele as expiou por nós, que somos os membros de Seu Corpo Místico. Mas como a causa primeira não torna inúteis as causas segundas, o sacrifício do Salvador não torna inútil o nosso, mas o suscita e dá-lhe o valor. Maria dera-nos o exemplo, ao unir-se aos sofrimentos de seu Filho; desta feita, expiara por nós, a ponto de merecer o título de Co-redentora.
Ela aceitou o martírio de seu Filho ― Que, além de amado, era legitimamente adorado ― que ela amava com coração afectuosíssimo, desde que O concebera virginalmente.
Mais heróica que o patriarca Abraão, o qual pronto a imolar seu filho Isaac, Maria, ao oferecer seu Filho por nossa salvação, viu-O morrer realmente entre atrocíssimos sofrimentos físicos e morais. Não veio nenhum anjo para impedir a imolação e dizer a Maria, tal como ao patriarca, em o nome do Senhor: “agora Eu sei que temes a Deus, pois não Me recusaste teu próprio filho, teu filho único”. (Gn 22, 12); Maria viu realizar-se efectiva e plenamente o sacrifício reparador de Jesus, e em face ao qual o de Isaac era senão a figura em preâmbulo. Ela sofrera do pecado na proporção de seu amor por Deus ― a Quem o pecado ofende; por seu Filho ― a Quem o pecado crucificara; por nossas almas ― a quem o pecado corrompe e mata. A caridade da Virgem ultrapassava incomensuravelmente a do patriarca; e nela, ainda mais que nele, realizaram-se as palavras que este escutara: “pois que fizeste isto, e não Me recusaste teu filho, teu filho único, Eu te abençoarei. Multiplicarei a tua posteridade como as estrelas do céu” (Gn, 22, 16-17).
Ora, como o sacrifício de Jesus e de Maria foi sacrifício de propiciação ou reparação pelo pecado, de expiação da pena devida ao pecado, façamos do sacrifício de nossa vida ― em união com eles ― uma reparação de todas as nossas faltas; peçamos desde agora a graça de fazer tal sacrifício com grande amor, o que lhe aumentará ao dobro o valor. Sejamos contentes de pagar essa dívida à justiça divina para que a ordem seja-nos plenamente restabelecida. E se, com tal espírito, unimo-nos intimamente às missas que se celebram todos os dias, à oblação sempre pulsante do Coração do Cristo ― oblação que é a essência dessas missas ― então alcançaremos a graça de fazermo-nos acompanhar dela, mesmo ao último momento. Se essa união de amor a Cristo Jesus é a cada dia mais íntima, a expiação do Purgatório será notoriamente abreviada para todos; poderia acontecer de recebermos a graça de passar nosso Purgatório totalmente por sobre a terra, aumentando no amor e merecendo-o, em vez de fazê-lo após a morte, sem merecê-lo.

Garrigou-Lagrange: La vie spirituelle nº 194, nov. 1935

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