quarta-feira, 27 de julho de 2011

VIGILÂNCIA IGREJA

Comentário pessoal...


Não é certamente inútil lembrar que tudo quanto a Beata Alexandrina escreveu no seu “Diário” (Sentimentos da alma) não se referia unicamente ao tempo em que ela viveu, mas certamente e sobretudo aos nossos tempos. Vejamos o porquê desta afirmação.
Primeiramente: Os escritos da beata só começaram a ser conhecidos quando o Padre Mariano Pinho publicou os dois primeiros livros sobre a sua dirigida (“Una vítima da Eucaristia” e “No calvário de Balasar”). Isto aconteceu nos fins dos anos 50 e princípio dos anos 60. Mas estas duas obras essenciais, apenas abordam alguns extratos dos mesmos documentos, extratos escolhidos com muito cuidado, para não “estorvarem” o processo canónico que em breve iria ser começado.
Segundamente: As comunicações sociais não eram as mesmas nem tinham o mesmo impacto que aquelas que hoje conhecemos e utilizamos sem restrições.
Em 1954, estávamos a uma dezena de anos do Concílio do Vaticano II e das grandes modificações que iriam ser operadas na Igreja, não porque o dito Concílio tenha sido um mal para a Igreja — penso-o sinceramente — mas pela má aplicação que dele fizeram algumas igrejas locais, aproveitando a situação para instaurarem modificações contrárias aos princípios mesmo do Concílio e até mesmo provocando algumas heresias que ainda hoje persistem, infelizmente, nesses países.
Sabemos que a Beata Alexandrina beneficiava de diversos carismos, entre os quais o da profecia. Em 1945 descreveu com uma precisão extraordinária o que se iria passar quase vinte anos mais tarde, no que diz respeito à Sagrada Comunhão.
Em 19 de Novembro de 1954, recebeu de Jesus estas palavras:
— “Minha filha, minha filha, escuta o meu desabafo. O mundo peca loucamente, dia e noite. Não cessa de desafiar a justiça de meu Pai, mas os sacerdotes, tantos sacerdotes, aquelas almas a Mim consagradas, tomam-me nas suas mãos, esmagam-me, põem-me todo em sangue com os seus sacrilégios, vida de vícios. Os seus maus exemplos abrem abismos para a perda de tantas, tantas, tantas almas. Vigilância à Igreja, principie a Igreja. Haja uma renovação de vida!”
Esta “queixa” de Jesus não necessita de comentários, seriam quase sobrerealitas aqui.
Não se trata nesta “nota” de criticar os sacerdotes pelos quais tenho o maior respeito e um grande carinho, mas também não se pode dizer que Jesus se enganou quando assim falou à Beata Alexandrina, tantos são os casos que todos temos ainda presentes nas nossas mentes, visto que recentemente evocados pelos jornais e televisões do mundo inteiro.
Dizer que de todos os tempos assim foi, seria fácil como argumento. Não, os tempos não foram todos como o nosso tempo, mesmo se estou convencido que a história do mundo se desenrolou, até aos nossos dias, em ciclos relativamente semelhantes uns aos outros. O nosso tempo, porque é justamente o nosso, parece ser pior — e isto não é pessimismo da minha parte! — do que qualquer outro, justamente devido, ou graças, aos meios de comunicação actuais, que são inimagináveis.
A Beata Alexandrina confessa: “Não posso dizer, não sei dizer em que estado vi o meu Jesus. Todo o Seu ser era uma massa de sangue. Não tinha forma humana. Ai, como eu vi o meu Jesus!... E como aquela massa dava sangue, só sangue!”
Certos teólogos afirmam, com grande rompante, que Jesus deixou de sofrer com a sua própria Resurreição e a sua Glorificação junto do eterno Pai. É verdade e não, porque Cristo continuará a sofrer até ao fim dos tempos no seu Corpo místico que é a Igreja. O mesmo é dizer, como disse São Paulo, que cada um de nós deve “sofrer no seu próprio corpo, aquilo que faltou à Paixão de Cristo” e faltou porquê? Simplesmente porque Jesus adicinou aos seus próprios sofrimentos, todos aqueles pecados, ofensas e blasfémias que o fariam sofrer até à consumação dos séculos. Isto não exclui de maneira nenhuma, todas as orações, desagravos e ofertas que lhe seriam feitos durante esse mesmo péríodo, período no qual devemos incluir a Beata Alexandrina que muito bem compreendeu esta maneira pela qual Deus tinha escolhido para redemir o mundo. Por isso mesmo, a cada passo, em qualquer ocasião ela exclama e grita mesmo, com uma fé inalterável:
— Sou a Vossa vítima, sou a Vossa vítima. Sede Jesus, transformai-Vos na beleza de Jesus.
Que fazer?
Para nós que, prevenidos “a tempo”, uma solução se apresenta, clara e nítida: orar. Se a nossa oração for sincera, podemos “influenciar” o Coração do Pai, podemos abrandar o peso da sua divina Justiça, porque Deus sendo Amor, este amor sobrepassa a Justiça e leva deus a reconsiderar a nossa posição de pecadores, mas de pecadores arrependidos e prontos a espiar as nosas faltas, os nossos pecados.
Mas, quem tem pecados hoje?
Vivo há mais de quarenta anos num pais que banio a palavra pecado, porque, Deus sendo amor, perdoa tudo e mais alguma coisa. Por isso mesmo, nem é necessário confessar-se diante dum sacerdote, porque Deus “vê tudo, mesmo o que é secreto” e por isso mesmo sabendo que pecámos, logos nos perdoa, nem sendo mesmo necessário pedir-lhe perdão... Esta é uma das heresias duma parte da Igreja de França.
No momento da Comunhão, todos se levantam e todos estedem a mão para receberem o Rei dos reis, para receberem o Deus, único e verdadeiro. Mas, quantos se confessaram e pediram perdão pelos pecados cometidos? Quantos destes tiveram a coragem de ajoelhar diante dum sacerdote — representante de Cristo na terra — e de lhe dizerem humildemente: “Padre, perdoe-me porque pequei” e de confessar todos os desaires que em cada dia cometemos contra o nosso Deus de amor?
Pessimista!
Não, de maneira nenhuma e, dizer o contrário do que aqui afirmo, seria mentir e tratar Deus de mentiroso.
O Beato João Paulo II disse muitas vezes que nesta época em que vivemos, muitas vezes se confunde o bem com o mal e o mal com o bem; que muitas vezes dizemos ser bem o que é mal e mal o que é bem.
Será isto maldicência ou falta de caridade?
Penso que não, pois dizer e explicar uma verdade que só os cegos (voluntários) não vêem, só pode ser uma obra de misericórdia.
Somos todos pecadores e eu, talvez o maior de todos, e todos queremos ser salvos, participar na Mansão celeste da glória de deus, por isso mesmo devemos amr-nos uns aos outros e uns aos outros nos estimular a viver a verdade de Deus e não a nossa verdade.
Então, se assim é, sejamos soficientemente humildes para dizermos, para gritarmos do fundo dos nossos corações, como a Beata Alexandrina de Balasar:
— Sou a Vossa vítima, sou a Vossa vítima. Sede Jesus, transformai-Vos na beleza de Jesus.
Vem, Senhor Jesus!
Afonso Rocha

quarta-feira, 20 de julho de 2011

COMO TRABALHAM OS DEMÓNIOS

Quando estes tentadores ordinários encontram almas fortes...

Os demónios que permanecem no meio de nós, e receberam o poder de nos tentar, são todos espíritos caídos do último coro. Os anjos destinados à nossa guarda são também simples anjos. Estes espíritos tentadores estão sem cessar ocupados na preparação da nossa perca. Os meios que eles utilizam para isso são tão subtis e tão variados, que a alma que a eles escapa pode sentir-se feliz e não deveria nunca esquecer de agradecer a Deus tão grande graça.

Nem um só momento, quer de dia quer de noite, estes cruéis inimigos deixam de nos tentar ora de uma maneira ora de outra, de maneira a desanimar aqueles que eles não podem vencer nem pela astúcia nem pela violência. A paciência é pois a arma defensiva por excelência. Ai daqueles que a deixam cair das próprias mãos !

Quando estes tentadores ordinários encontram almas fortes e pacientes, que eles não podem nem começar, chamam, para ajudá-los, companheiros mais astuciosos et mais ardis, não para combater com eles ou no lugar deles, porque Deus não o permite, mas para lhes sugerirem estratagemas mais eficazes.

Francisca sabia tudo isso por experiência ; era raro que ela fosse tentada por um só demónio. Regularmente outros vinham associar-se aos primeiros ; e fracos ainda, estes recorriam à malícia dos espíritos superiores que permaneciam no ar.

Ela tinha-se tornado tão perita nesta guerra, que travando combate, ela sabia a que coro (dos anjos) tinha pertencido aquele que dirigia, assim como quem ele era.


Santa Francisca Romana : Tratado do inferno ; Cap. VI.

domingo, 10 de julho de 2011

É INDIZIVEL A DOR DE JESUS !

Tinha que ser condenada à morte

Durante esta noite senti-me no Horto; lá sofri como se fosse despida e açoitada. Lá vi, lá sofri como se fosse coroada de espinhos e com o corpo despedaçado pelos açoites, levada à varanda de Pilatos. Vi a multidão do povo ouvi suas vociferações: tinha que ser condenada à morte. A noite estava escura e serena, que não deixava mover uma só folha das oliveiras, a não ser quando a dor tudo obrigava a tremer, à solidão e a vir todo o abandono, mesmo até do Eterno Pai. E àquela hora onde estava a Mãezinha? Quanto sofria Ela com a reparação e a despedida de Jesus! Ele, dentro de mim, via e sofria a Sua dor, via onde Ela estava, via a distância que Os separava. Que dor sem igual! E, hoje, sinto em meu coração a dureza dos corações, que acompanhavam Jesus, pelas tristes ruas do calvário; nada os comovia, nem o sangue de Jesus, nem o Seu santíssimo corpo ferido, nem ver o amor com que Ele aceitou e levou a cruz, já quase moribundo. Ao terminar do calvário, Jesus deu-me um profundo suspiro; e o Seu olhar moribundo, mas divino levou a todos um olhar de convite, amor e perdão. Que olhar de tantos segredos misteriosos! Quisesse ou não eu tinha que sentir e ver as graças abundantes que davam aqueles olhares de Jesus; quisesse ou não quisesse, tive que sentir e ver o calvário e todo o mundo a desprezá-las a deitá-las fora. É indizível a dor de Jesus e a minha com a d’Ele; ver tantos sofrimentos inúteis, ver para tantos nada valer a Sua paixão e morte. Senti dentro em meu peito o último suspiro de Jesus: agonizei com Ele. Momentos depois, senti abrasar-se-me o coração; parecia-me estar a nadar num mar de fogo. E logo me falou Jesus assim:
— Venho a ti, minha filha, cheio de amor e compaixão; amor para te encher e compaixão pela tua dor, por tanto te ver sofrer. Sofreste tu, Minha filha, mas não Eu. Repara; vês como venho sem nenhum ferimento? Foi atingido o teu coração e não o Meu. Tem coragem, Minha filha! Eu pedi-te dor, sempre dor, para espalhar pelo mundo, e foi ao mundo que a estendi com a mistura do Meu divino amor. Pedi-te dor, sempre dor, porque de muita dor necessito, para bem das almas, e muita dor via para te darem. Coragem! Eu poderei dizer de ti o que disse: as portas do inferno não prevalecerão contra mim, isto é, contra a Minha Igreja. E agora digo: a raiva humana, que mais parece infernal, nada poderá contra a Minha divina causa. Anima-te, esposa querida. Consentes em te pedir dor, sempre mais dor? Consentes em seres imolada, a mais não poder ser? Peço-te consentimento, porque nada vale a dor sem a generosidade, sem o teu querer, sem o teu amor. O mundo necessita de tudo. Não deixeis, filha amada, morrerem as almas de fome. Aceitas?
— Já sabeis que sim, meu Jesus; escusado é dizer-Vos que tudo aceito e sofro, por Vosso amor e pelas almas. Sou a Vossa vítima. Mas pedis-me assim tanta dor; o que virá mais? Eu já queria dizer-Vos, na última vez que falei convosco, o que me esperava, pois achava que acentuáveis tanto a palavra dor, que tanto fazíeis penetrar em mim, e que tudo isso queria dizer mais alguma coisa; mas não atreve a perguntar-Vos nada. Compreendi tudo, todos os teus desejos, mas nada te disse, para não te atemorizar. Dizei-me, meu Jesus. E não serei eu uma iludida das Vossas coisas e nossa ilusão a iludir tantos e mais ainda aos que me são tão queridos?
— Sossega, sossega, Minha filha, confia no teu Jesus. Não é uma ilusão; é a realidade. Tu foste cheia das maiores graças das maiores maravilhas do Senhor. Sossega, de ti quero o sofrimento com o silêncio. E darei a minha luz, a luz do Espírito Santo àqueles que precisam dela. Confia em Mim; todo o Céu se alegrou com a consolação que Me deste, com a coragem do teu sofrer. A tua dor foi para as almas uma primavera de flores. O teu heroísmo, o teu amor à cruz, pôs o Céu, a tua pátria em festa. Entoaram, em Meu louvor, hinos jubilosos. Vou dar-te agora uma gota do Meu sangue divino, para reparares as forças perdidas. Consumiste mais forças nestes dias de sofrimento do que num ano dos trabalhos mais austeros de jejum, a pão e água. Vem a mim; é fácil a operação.
Jesus abriu o Seu divino lado e abriu também o meu; uniu os Nossos corações e logo deixou cair do d’Ele no meu uma gotinha do Seu divino sangue. Senti logo o coração mais forte, a dilatar-se. Jesus colocou um e outro no seu lugar; cerrou o Seu santíssimo peito, cerrou também o meu, bafejou com o Seu bafo divino, deixou-o sem cicatriz.
— Vai agora, filhinha amada; vai sofrer, vai cheio do Meu divino amor; vai espalhá-lo pelo mundo; leva a Minha graça, leva a Minha força. Tem coragem; nada temas. Jesus é contigo; sempre contigo.
— Obrigada, meu Jesus; só em Vós é que eu confio.
Como gosto de dizer: Bendito seja Deus, bendita seja a minha cruz. Voltei para os meus sofrimentos, a tudo ver desenrolar à minha frente; tudo me causa pavor, nada queria escrever. Se não fosse a minha oferta da noite de Natal ao Menino Jesus, mais nada escrevia; ficava como se tido morresse. Assim quero só, quero sempre a vontade do meu Senhor.

(Beata Alexandrina Maria da Costa: Sentimentos da alma, 14 de Fevereiro de 1947. - Sexta-feira

quarta-feira, 6 de julho de 2011

SOU O TEU GUIA

Cega, sem nada ver, caí à borda da estrada

O coração sente e vê o meu túmulo, não sai do pé dele, enquanto todo o outro ser em suor banhado segue a sua canseira num abismo tal sob o peso de milhões e milhões de mundos. Quando está nesta profundidade, parece que não pode voltar à superfície da terra. Com a perda de Jesus e da Mãezinha, do Calvário e do Horto, perdi tudo para jamais voltar a possuir.
Que dor, que dor infinita! A passagem pelo horto e pela montanha é como que por terra estranha, terra morta, sem luz, sem amor. Parece que, ainda que quisesse recordar o que tudo isto foi, não podia. Sem mal poder mover os lábios, falando mais com o coração, chamei por Jesus e pela Mãezinha: necessitava do Seu conforto.
Eram já três horas e alguns minutos sem que Ele viesse. Num dado momento, surgiu-me de repente. Com um foco de luz iluminou-me, tomou-me toda inteiramente e meteu-me no seu Divino coração.
— “Vem, minha filha, descansar na morada do meu Divino coração; aqui estás e dele vives. Vive do sacrário, vive da cruz, nela bem cingida, nela bem crucificada. Comunica a vida do Calvário, a vida do sacrário e a deste Coração Divino. Vives para os teus Amores, falas dos teus Amores. Coragem, recebe aqui conforto, recebe aqui fortaleza para tantas forças que a dor consome.”
Não sei o tempo que estive dentro desta doce morada. De repente, fiquei sozinha; fugiu-me a luz e o lugar de repouso. Cega, sem nada ver, caí à borda da estrada. Levantar-me não podia, os meus gemidos não se ouviam e em tal escuridão não podia ser encontrada. Perdi tudo: não tenho Jesus nem a Mãezinha, estou sem guia. Parecia ali uma eternidade, a minha eternidade, aquela eternidade que eu vivo há tanto tempo, sempre em princípio, sem um momento caminhar. O meu brado continuou, assim como o meu esforço para levantar-me. Não fui capaz. Jesus veio, foi Ele quem me levantou e sem que eu visse que era Ele; tinha que acreditar pela fé. Tomou-me pela mão e, caminhando comigo, como se eu fora ceguinha e nenhum caminho conhecesse, foi-me falando assim:
— “Sou o teu guia, sou o teu Jesus. Colóquio de fé, vive da fé, colóquio de dor, vive na dor. Coragem, minha filha! O mundo corre sempre para o abismo da perdição. Se assim não sofresses, já toda a terra ter-se-ia aberto num só vulcão de fogo. Quantas almas, quantas almas teriam caído no inferno nas horas destinadas a lá as receber. Quantos sacerdotes lá estavam precipitados. Quantos, quantos! Para a reparação dos sacerdotes, outros a prepararem-te a imolação! Acode ao mundo, lembra-te que ele é teu!”
Nova ausência de Jesus, até que voltou a vir, uniu os nossos corações e disse-me:
— “Recebe a gota do meu divino Sangue. Vives só a minha vida; comunica ao mundo a mesma vida. Salva-o e não te esqueças que to entreguei, que ele é teu.”
Pus-me a fazer-Lhe os meus pedidos e não cheguei a dizer-Lhe o meu obrigada sem que Ele tivesse desaparecido. Creio, creio!
(Beata Alexandrina Maria da Costa: Sentimentos da alma, 26/02/1954- Sexta-feira).

domingo, 3 de julho de 2011

UNIRAM-SE OS CORAÇÕES

Jesus pede amor e pede reparação

Nesta manhã, segui as ruas da amargura; não podiam ser mais tristes e amargas. O meu coração foi sangrando em toda a viagem. Quanto mais caminhava, mais espinhos e lanças o feriam. O corpo, sem poder aguentar o peso da cruz, caiu desfalecido. Jesus parecia que ia ofegante, dentro de mim. No alto da cruz continuei a senti-lo ofegante, mas quase sem vida. O Seu Divino Coração agonizante ia agonizando dentro do meu. Também no meu coração, os Seus divinos lábios balbuciaram: “Tenho sede!” E foi nesta sede de amor que Jesus entregou o Seu espírito e o meu com O d’Ele. Depressa senti como se de cima abaixo se rasgasse um véu, e Jesus apareceu-me com a Sua luz e deu-me a Sua vida. Após uns momentos, falou-me assim:

– Aqui está Jesus, o mendigo, o pedinte do amor. Aqui está Jesus, o pedinte, o mendigo da dor, daquela dor que repara, daquela dor que dá a vida às almas. Repara o Coração Divino de Jesus, dá às almas a vida da graça, as quais custaram o Seu Divino Sangue. Reparai, reparai bem quem é o pedinte, quem é o mendigo. É Jesus, é Jesus, ansioso de se dar, de se dar todo, com todas as riquezas do Seu Divino Coração. É Jesus, ansioso de possuir inteiramente os corações da humanidade inteira. Reparai e ponderai como é grande, infinitamente grande o amor misericordiosíssimo de Jesus. Reparai! Jesus baixa do Céu à terra, vem ao coração da Sua esposa e vítima pedir, pedir incessantemente. Jesus pede amor e pede reparação. Ó minha filha, minha filha, os pecadores rasgam à espada o meu Divino Peito e atingem cruelmente este Coração que tanto amou e ama. Ó minha filha, minha filha, os meus divinos olhos têm que chorar. Este Coração amorosíssimo não pode cessar de sangrar; a chaga está aberta. Fazem-Me chagas sobre chagas. São os pecadores, são os ingratos, são os cruéis.

– Sossegai, sossegai, Jesus. Parem ao longe, muito ao longe, não de mim mas sim de Vós; longe de Vós para ferir-Vos, mas perto de Vós para receberem o Vosso perdão. Parem e venham todos para mim, para ferirem o meu pobre coração, para não ferirem o Vosso. Parem e venham todos para mim com todas as crueldades, com todos os martírios, para que eu possa, sim, meu Jesus, dar-Vos a Vós toda a reparação necessária. Eu quero chorar e chorar sempre, meu Jesus, as Vossas lágrimas. Eu quero sofrer e sentir sempre as Vossas dores. Parem, parem ao longe os corações ingratos, para não usarem para Vós de mais ingratidão. Venham, venham para mim todos. Estou pronta a imolar-me, a sacrificar-me, para não ver o meu amantíssimo Jesus chorar nem sofrer.

– Pede, pede, minha filha, pede mais uma vez a Sua Santidade, ao Papa, ao meu representante na terra que a sua voz se faça ecoar na humanidade inteira como trombeta celeste que vem avisar, que vem prevenir, que cai em breve, muito em breve, sobre o mundo culpado, toda a justiça, toda a vingança do Senhor. Que mais uma vez ecoe a sua voz de Pai. Filhos meus, pede-vos Jesus. Fazei oração, fazei penitência. Convertei-vos! Deixai-vos dos crimes e das iniquidades, minha filha, minha filha, todo o pai que avisa ama. Todo o pai que repreende é correcto e fiel à lei do Senhor, assim como Eu o sou à lei do meu Pai.

– Ó meu Jesus, ó meu Jesus, estou cheia de medo, estou aprovada. A minha lama vê o mundo destruído, todo em ruínas. E parece que o Céu, revestido de nuvens negras, esmaga a terra e sobre ela deixa cair um fogo, um fogo consumidor. É a chuva, é a chuva da justiça. Bem o compreendo, meu Jesus. Perdoai, perdoai, sou a Vossa vítima. Perdoai por mais tempo. Perdoai, perdoai sempre.

– Vem, minha filha, minha amada filha. Recebe a gota do meu divino Sangue. Uniram-se os corações, O de Jesus com o da Sua esposa. Passou lentamente a gotinha de sangue. É a tua vida, é a tua vida. Jesus to afirma. É a força na tua imolação. É a vida que dás às almas. Vives de Jesus, dás a vida de Jesus. Vives a vida da graça, é a vida da graça que tu dás. Tem coragem, estou contigo. O meu divino Coração não pode separar-se do teu coração sofredor. Coragem, coragem! Fica na cruz.

– Obrigada, meu Jesus, obrigada, meu Amor!
(Beata Alexandrina Maria da Costa: Sentimentos da alma, 22 de Fevereiro de 1952 – Sexta-feira)

sábado, 2 de julho de 2011

VISÃO DA SANTÍSSIMA TRINDADE

Não sou eu que sofro, mas sim Jesus...

O meu sofrimento aumenta, a minha cruz pesa-me mais de momento para momento. Sinto-me como se estivessem a terminar os meus dias aqui na terra. O meu pobre corpo é uma massa em sangue, desfeito pela dor. Vivo como se não vivesse. O que será de mim, meu Jesus! Amo a cruz e não tenho forças para a abraçar. Sinto-me arrefecer, estou gelada. Quanto mais sofro, menos sinto amar a Jesus. Quanto mais Lhe ofereço os meus sofrimentos, nas minhas negras e dolorosas trevas, menos sinto que Lhe dou. Não tenho para Ele um sorriso, um acto de amor ou reparação. Sou pobre, mísera pobre; o que Lhe dou, nada me pertence. Sinto-me, por vezes, na divina presença de Jesus, de mãos vazias, olhos baixos, cabeça inclinada, envergonhada de mim mesma. Que contas Vos hei-de dar, meu Deus, a Vós, de quem tudo recebi a quem nada dei e nada tenho para dar. Triste confusão a minha! Poderei viver sem sofrer e sem amar O meu Jesus? Oh! não, não posso sem isso a vida seria para mim já um inferno. Ó Jesus aceitai para Vós o meu sofrimento e mesmo sem sentir amor fazei que Vos ame, deixai-me enlouquecer por Vós.
Os espinhos nascem para mim, noite e dia, como noite e dia nascem e crescem as flores dos campos e jardins. Por todos os lados os sinto e vejo a ferirem-me. Eu quero-os e amo-os, mas desfaleço em recebê-los; recebe-os como mimos do Céu, como carícias de Jesus.
Pressinto que novos e agudos espinhos alguém prepara para me cravar; parece-me ouvir o rumor de nova tempestade. Levantam-se contra mim novas ondas furiosas. De novo me estendo na cruz; deixo-me crucificar à semelhança do meu Senhor.
Na noite de 14 para 15, veio de encontro ao meu martírio, suavizar a minha dor, uma linda visão da SS. Trindade: era um trono riquíssimo: no cimo o divino Espírito Santo em forma de pomba deixava cair sobre O Pai e sobre O Filho que mais abaixo, ao lado um do outro, estavam sentados, uma chuva de raios doirados. Pouco depois, diante do Eterno Pai, uma alma ficou ajoelhada em sinal de reverência; uniu-se a uma mão dela uma mão de Jesus que o Padre Eterno ligou. Tudo estava iluminado, parecia o Céu, era luz celeste. Desapareceram as três divinas pessoas e a alma ficou por algum tempo na mesma posição, mergulhada no mesmo amor.
Confortou-me também a visão, duma vez de S. José, e, doutra, de Nossa Senhora; um e outro com o Menino Jesus ao colo. São eles que me levantam, são eles a força e a coragem do meu tanto sofrer. Não sou que sofro, mas sim Jesus, só Jesus que sofre por mim.
(Beata Alexandrina de Balasar: Sentimentos da alma, 25 de Abril de 1947 - Sexta-feira)

segunda-feira, 28 de março de 2011

COMUNHÃO REPARADORA NOS PRIMEIROS SÁBADOS

CINCO PRIMEIROS SÁBADOS

I – A DEVOÇÃO DOS PRIMEIROS SÁBADOS

Na Aparição do dia 13 de Julho anunciou Nossa Senhora em Fátima: “Para impedir a guerra virei pedir a consagração da Rússia ao meu Imaculado Coração e a Comunhão reparadora nos Primeiros Sábados”.

Esta última devoção veio pedi-la, aparecendo à Irmã Lúcia a 10-12-1925, em Pontevedra, Espanha. Disse então: “Olha, minha filha, o meu coração cercado de espinhos que os homens ingratos a todos os momentos me cravam com blasfémias e ingratidões. Tu, ao menos, procura consolar-me e diz que prome-to assistir na hora da morte, com todas as graças necessárias para a salvação, a todos os que, no Primeiro Sábado de cinco meses seguidos, se confessarem, receberem a Sagrada Comunhão, rezarem um terço e me fizerem companhia durante quinze minutos, meditando nos 15 mistérios do Rosário com o fim de me desagravar”.

Nª Senhora mostrou o seu Coração rodeado de espinhos, que significam os nossos pecados. Pediu que fizéssemos actos de desagravo para Lhos tirar, com a devoção reparadora dos cinco Primeiros Sábados. Em recompensa, promete-nos "todas as graças necessárias para a salvação”.

Jesus nos dois anos seguintes, 15 de Fevereiro de 1926 e 17 de Dezembro de 1927, insiste para que se propague esta devoção. Lúcia escreveu: “Da prática da devoção dos Primeiros Sábados, unida à consagração ao Imaculado Coração de Maria, depende a guerra ou a paz do mundo”.

II – CINCO, POR QUÊ?

São cinco os Primeiros Sábados por, segundo revelou Jesus, serem “cinco as espécies de ofensas e blasfémias proferidas contra o Imaculado Coração de Maria.

1. – As blasfémias contra a Imaculada Conceição, 2. – Contra a sua Virgindade ; 3. – Contra a Maternidade Divina, recusando ao mesmo tempo recebê-la como Mãe dos homens ; 4. – Os que procuram infundir nos corações das cri-anças a indiferença, o desprezo e até o ódio contra esta Imaculada Mãe ; 5. – Os que A ultrajem directamente nas suas sagradas imagens”

III – CONDIÇÕES

As condições para ganhar o privilégio dos Primeiros Sábados são quatro:

1. Confissão. Para cada Primeiro Sábado é precisa uma confissão com intenção reparadora. Pode fazer-se em qualquer dia, antes ou depois do Primeiro Sábado, contanto que se receba a Comunhão em estado de graça.

A vidente perguntou: – “Meu Jesus, as (pessoas) que se esquecerem de formar essa intenção (reparadora)? Jesus respondeu – Podem formá-la na confissão seguinte, aproveitando a primeira ocasião que tiverem para se confessar”.

As outras três condições devem cumprir-se no próprio Primeiro Sábado, a não ser que algum sacerdote, por justos motivos, conceda que se possam fazer no domingo a seguir.

2. A Comunhão Reparadora.

3. O Terço.

4. A meditação, durante 15 minutos, de um só mistério, de vários ou de todos. Também vale uma meditação ou explicação de 3 minutos antes de cada um dos 5 mistérios do terço que se está a rezar.

Em todas estas quatro práticas deve-se ter a intenção de desagravar o Imaculado Coração de Maria.

A devoção dos 5 Primeiros Sábados foi aprovada pelo Bispo de Leiria a 13-9-1939, em Fátima.

ACTO DE CONSAGRAÇÃO E DESAGRAVO

Virgem Santíssima e Mãe nossa querida, ao mostrardes o vosso Coração cerca-do de espinhos, símbolo das blasfémias e ingratidões com que os homens ingratos pagam as finezas do vosso amor, pedistes que Vos consolássemos e de-sagravássemos.

Ao ouvir as vossas amargas queixas, desejamos desagravar o vosso doloroso e Imaculado Coração que a maldade dos homens fere com os duros espinhos dos seus pecados.

Dum modo especial Vos queremos desagravar das injúrias sacrilegamente proferidas contra a vossa Conceição Imaculada e Santa Virgindade. Muitos, Senhora, negam que sejais Mãe de Deus e nem Vos querem aceitar como terna Mãe dos homens. Outros, não Vos podendo ultrajar directamente, descarregam nas vossas sagradas imagens a sua cólera satânica. Nem faltam também aqueles que procuram infundir nos corações das crianças inocentes, indiferença, desprezo e até ódio contra Vós.

Virgem Santíssima, aqui prostrados aos vossos pés, nós Vos mostramos a pena que sentimos por todas estas ofensas e prometemos reparar com os nossos sacrifícios, comunhões e orações tantas ofensas destes vossos filhos ingratos.

Reconhecendo que também nós, nem sempre correspondemos às vossas predilecções, nem Vos honrámos e amámos como Mãe, suplicamos para os nossos pecados misericordioso perdão.

Para todos quantos são vossos filhos e particularmente para nós, que nos consagramos inteiramente ao vosso Coração Imaculado, seja-nos ele o refúgio du-rante a vida e o caminho que nos conduza até Deus. Assim seja.

CINCO, PORQUÊ?

O Padre José Bernardo Gonçalves (1894-1966) propôs em Maio de 1930 à Irmã Lúcia, de quem foi confessor, seis perguntas para as quais pedia esclarecimento.

Eis o que se refere à quarta, com a respectiva resposta dada por escrito:

« Porque hão-de ser ‘5 sábados’ e não 9 ou 7 em honra das dores de Nossa Se-nhora ?

Ficando na capela com Nosso Senhor parte da noite do dia 29 para 30 deste mês de Maio de 1930, e falando a Nosso Senhor das duas perguntas 4.ª e 5.ª, senti-me de repente possuída intimamente da divina presença; e, se não me engano, foi-me revelado o seguinte :

‘Minha filha, o motivo é simples: são 5 as espécies de ofensas e blasfémias contra o Imaculado Coração de Maria:

1.ª – As blasfémias contra a Imaculada Conceição.

2.ª – Contra a Sua virgindade.
3.ª – Contra a Maternidade Divina, recusando, ao mesmo tempo, recebê-La como Mãe dos homens;
4.ª – Os que procuram publicamente infundir, nos corações das crianças, a indiferença, o desprezo, e até o ódio para com esta Imaculada Mãe ;

5.ª – Os que A ultrajam directamente nas suas sagradas Imagens.

Eis, Minha filha, o motivo pelo qual o Imaculado Coração de Maria Me levou a pedir esta pequena reparação; e, em atenção a ela, mover a minha misericórdia ao perdão para com essas almas que tiveram a desgraça de A ofender».

Primeira ofensa: negação da Imaculada Conceição.

A 8 de Dezembro de 1854, definiu o Papa Pio IX : « Declaramos, pronunciamos e definimos, que a doutrina que sustenta que a bem-aventurada Virgem Maria, no primeiro instante da sua Conceição, foi por graça e privilégio singular de Deus Todo-Poderoso... preservada e imune de toda a mancha do pecado origi-nal, foi revelada por Deus e como tal deve ser firme e constantemente acreditada por todos os fiéis ».

Recusam este privilégio várias confissões protestantes, os racionalistas, e implicitamente aqueles que negam o pecado original, pois que a Imaculada Conceição é precisamente a isenção dessa mancha, que em tal hipótese não existiria.

Segunda ofensa: negação da Virgindade perpétua de Maria.

A 6 de Novembro de 1982 disse João Paulo II no Santuário do Pilar em Sara-goça, Espanha : « De modo virginal ‘sem intervenção de varão, e por obra do Espírito Santo, Maria deu a natureza humana ao Filho Eterno do Pai. De modo virginal nasceu de Maria um corpo santo. É a fé que...o Papa Paulo IV articulava na forma ternária de Virgem ‘antes do parto, no parto e perpetuamente de-pois do parto’. É a mesma que ensina Paulo VI: ‘Cremos que Maria é Mãe sem-pre Virgem do Verbo encarnado ».

Opõem-se a esta verdade os que negam que a Conceição e o parto de Jesus não foram virginais, e que Maria não conservou no parto a sua integridade, assim como aqueles que afirmam que Ela teve mais filhos além de Jesus.

Terceira ofensa: negação da maternidade divina e espiritual de Maria.

Declarou o III Concílio de Constantinopla no ano de 680 : « Nosso Senhor Jesus Cristo – nasceu do Espírito Santo e de Maria Virgem, que é, segundo a humanidade, própria e verdadeiramente Mãe de Deus».

É também Mãe espiritual dos homens, pela sua participação no Mistério da Encarnação e Co-redenção.

Quarta ofensa: ódio para com a Imaculada Mãe de Deus.

A ideologia Marxista-comunista procurou eliminar todos os vestígios de reli-gião, a começar pelas crianças. O Ministério da Educação soviética declarou nesses tempos : « A educação comunista tem como fim principal eliminar todos os vestígios da religião ». Ensinava-se às crianças o racionalismo puro e, além disso, em certa nação, os pequeninos aprendiam « ladaínhas » de injúrias contra a Mãe de Deus.

Quinta ofensa: ultrajes às sagradas imagens.

Chegou-se ao descaramento de destruir e ultrajar as imagens de Nossa Senhora, sobretudo quando expostas em público. Certamente também desgostam a Maria Santíssima aqueles que tiram dos templos as suas imagens ou as redu-zem ao mínimo, contrariando o Concílio Vaticano II. « Observem religiosamente aquelas coisas que nos tempos passados foram decretadas acerca do cul-to das imagens de Cristo, da Bem-aventura Virgem e dos Santos ».

São estas cinco ofensas a Maria que devemos reparar nos cinco primeiros sábados.

Textos P. Fernando Leite, sj

































































segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

VERÓNICA JULIANI

Religiosa, Mística, Santa
1660-1727

Hoje, gostaria de apresentar uma mística que não é da época medieval; trata-se de Santa Verónica Juliani, monja clarissa capuchinha. O motivo é que no próximo dia 27 de Dezembro se celebra o 350° aniversário do seu nascimento. Città di Castello, lugar onde ela viveu durante muitos anos e faleceu, assim como Mercatello — sua cidade natal — e a diocese de Urbino, vivem este acontecimento com alegria.

Verónica nasce precisamente no dia 27 de Dezembro de 1660 em Mercatello, no vale do Metauro, filha de Francesco Juliani e Benedetta Mancini; é a última de sete irmãs, das quais outras três abraçarão a vida monástica; é-lhe conferido o nome de Úrsula. Aos sete anos perde a mãe, e o pai transfere-se para Piacenza como superintendente das alfândegas do ducado de Parma. Nessa cidade, Úrsula sente crescer em si o desejo de dedicar a vida a Cristo. O apelo faz-se cada vez mais urgente, a tal ponto que, com 17 anos, entra na estrita clausura do mosteiro das Clarissas Capuchinhas de Città di Castello, onde permanecerá durante toda a sua vida. Ali recebe o nome de Verónica, que significa «verdadeira imagem» e, com efeito, ela tornar-se-á deveras imagem de Cristo Crucificado. Um ano depois, emite a solene profissão religiosa: começa para ela o caminho de configuração com Cristo através de muitas penitências, grandes sofrimentos e algumas experiências místicas ligadas à Paixão de Jesus: a coroação de espinhos, as bodas místicas, a ferida no coração e os estigmas. Em 1716, com 56 anos, torna-se abadessa do mosteiro e é reconfirmada nesta função até à sua morte, ocorrida em 1727, depois de uma dolorosíssima agonia de 33 dias, que culmina numa profunda alegria, a tal ponto que as suas últimas palavras foram: «Encontrei o Amor, o Amor deixou-se ver! Esta é a causa do meu padecimento. Dizei-o a todas, dizei-o a todas!» (Summarium beatificationis, 115-120). Em 9 de Julho deixa a morada terrena para o encontro com Deus. Tem 67 anos, 50 dos quais transcorridos no mosteiro de Città di Castello. É proclamada Santa no dia 26 de Maio de 1839 pelo Papa Gregório XVI.

Verónica Juliani escreveu muito: cartas, relatórios autobiográficos e poesias. Todavia, a fonte principal para reconstruir o seu pensamento é o seu Diário, iniciado em 1693: vinte e duas mil páginas manuscritas, que abrangem um arco de trinta e quatro anos de vida claustral. A escrita flui espontânea e contínua, não há cancelamentos ou correcções, nem sinais de pontuação ou distribuição da matéria em capítulos ou partes, segundo um desígnio previamente estabelecido. Verónica não queria compor uma obra literária; aliás, foi obrigada a escrever as suas experiências pelo Padre Girolamo Bastianelli, religioso dos Filippini, de acordo com o Bispo diocesano Antonio Eustachi.

Santa Verónica tem uma espiritualidade acentuadamente cristológico-esponsal: é a experiência de ser amada por Cristo, Esposo fiel e sincero, e querer corresponder com um amor cada vez mais comprometido e apaixonado. Nela, tudo é interpretado em chave de amor, e isto infunde-lhe uma profunda serenidade. Tudo é vivido em união com Cristo, por amor a Ele, e com a alegria de poder demonstrar-lhe todo o amor de que a criatura é capaz.

O Cristo ao qual Verónica está profundamente unida é aquele que sofre na paixão, morte e ressurreição; é Jesus no gesto de se imolar ao Pai para nos salvar. É desta experiência que deriva também o amor intenso e sofredor pela Igreja, na dúplice forma da oração e da oferenda. A Santa vive nesta perspectiva: reza, sofre e procura a «santa pobreza» como «expropriação», perda de si (cf. ibid., III, 523), precisamente para ser como Cristo, que se entregou inteiramente a si mesmo.

Em cada página dos seus escritos, Verónica recomenda alguém ao Senhor, corroborando as suas preces de intercessão com a oferta de si em cada sofrimento. O seu amor dilata-se a todas «as necessidades da Santa Igreja», vivendo com ansiedade o desejo da salvação de «todo o universo» (Ibid., III-IV, passim). Verónica clama: «Ó pecadores, ó pecadoras... todos e todas, ide ao Coração de Jesus; ide à lavanda do seu preciosíssimo Sangue... Ele espera-vos com os braços abertos para vos abraçar» (Ibid., II, 16-17). Animada por uma caridade fervorosa, ela presta atenção, compreensão e perdão às irmãs do mosteiro; oferece as suas orações e os seus sacrifícios pelo Papa, pelo seu bispo, pelos sacerdotes e por todas as pessoas necessitadas, inclusive pelas almas do purgatório. Resume a sua missão contemplativa com estas palavras: «Não podemos ir pregando pelo mundo, para converter as almas, mas somos obrigadas a rezar incessantemente por todas aquelas almas que ofendem a Deus... de modo particular com os nossos sofrimentos, ou seja, com um princípio de vida crucificada» (Ibid., IV, 877). A nossa Santa concebe esta missão como um «estar no meio», entre os homens e Deus, entre os pecadores e Cristo crucificado.

Verónica vive de modo profundo a participação no amor sofredor de Jesus, convicta de que o «sofrer com alegria» é a «chave do amor» (cf. ibid., I, 299.417; III, 330.303.871; IV, 192). Ela evidencia que Jesus padece pelos pecados dos homens, mas também pelos sofrimentos que os seus servos fiéis tiveram que suportar ao longo dos séculos, no tempo da Igreja, precisamente mediante a sua fé sólida e coerente. Ela escreve: «O seu Pai eterno fez-lhe ver e sentir, nessa altura, todos os padecimentos que deviam suportar os seus eleitos, as suas almas mais amadas, ou seja, aquelas que teriam beneficiado do seu Sangue e de todos os seus sofrimentos» (Ibid., II, 170). Como diz de si o Apóstolo Paulo: «Agora alegro-me nos sofrimentos suportados por vós. O que falta às tribulações de Cristo, completo na minha carne, pelo seu corpo que é a Igreja» (Cl 1, 24). Verónica chega a pedir a Jesus para ser crucificada com Ele: «Num instante — escreve — vi sair das suas santíssimas chagas cinco raios resplandecentes; e todos vieram ao meu redor. E eu via estes raios tornar-se como que pequenas chamas. Em quatro delas havia os pregos; e numa a lança, como que de ouro, inteiramente abrasada: e trespassou-me o coração, de um lado para o outro... e os pregos trespassaram-me as mãos e os pés. Senti uma grande dor; mas, na mesma dor, eu via-me a mim mesma, sentia-me inteiramente transformada em Deus» (Diário, I, 897).

A Santa está convencida de participar antecipadamente no Reino de Deus mas, ao mesmo tempo, invoca todos os Santos da Pátria bem-aventurada para que venham em sua ajuda no caminho terreno da sua doação, à espera da bem-aventurança eterna; esta é a aspiração constante da sua vida (cf. ibid., II, 909; V, 246). Em relação à pregação dessa época, centrada não raro na «salvação da própria alma» em termos individuais, Verónica mostra um forte sentido «solidário», de comunhão com todos os irmãos e irmãs, caminho rumo ao Céu, e vive, reza e sofre por todos. As realidades penúltimas, terrenas, ao contrário, embora sejam apreciadas em sentido franciscano como um dom do Criador, são sempre relativas, inteiramente subordinadas ao «gosto» de Deus e sob o sinal de uma pobreza radical. Na communio sanctorum, ela esclarece a sua doação eclesial, assim como a relação entre a Igreja peregrina e a Igreja celeste. «Todos os Santos — escreve — estão lá em cima mediante os méritos e a paixão de Jesus; mas para tudo quanto nosso Senhor realizou, eles cooperaram, de tal modo que a sua vida foi inteiramente ordenada, regulada pelas (suas) mesmas obras» (Ibid., III, 203).

Nos escritos de Verónica encontramos muitas citações bíblicas, às vezes de modo indirecto, mas sempre claras: ela revela familiaridade com o Texto sagrado, do qual se nutre a sua experiência espiritual. Além disso, há que revelar que os momentos fortes da experiência mística de Verónica nunca estão separados dos acontecimentos salvíficos, celebrados na liturgia, onde ocupam um lugar particular a proclamação e a escuta da Palavra de Deus. Portanto, a Sagrada Escritura ilumina, purifica e confirma a experiência de Verónica, tornando-a eclesial. Mas por outro lado, precisamente a sua experiência, alicerçada na Sagrada Escritura com uma intensidade excepcional, guia a uma leitura mais profunda e «espiritual» do mesmo Texto, entra na profundidade escondida do texto. Ela não só se exprime com as palavras da Sagrada Escritura, mas também vive realmente destas palavras, que nela se tornam vivas.

Por exemplo, a nossa Santa cita com frequência a expressão do Apóstolo Paulo: «Se Deus é por nós, quem será contra nós?» (Rm 8, 31; cf. Diário, I, 714; II, 116.1021; III, 48). Nela, a assimilação deste texto paulino, esta sua grande confiança e profunda alegria tornam-se um acontecimento completo na sua própria pessoa: «A minha alma — escreve — foi unida à vontade divina, e eu estabeleci-me verdadeiramente e fixei-me para sempre na vontade de Deus. Parecia que nunca mais me iria afastar desta vontade de Deus, e voltei a mim com estas palavras específicas: nada me poderá separar da vontade de Deus, nem angústias, nem penas, nem dificuldades, nem desprezos, nem tentações, nem criaturas, nem demónios, nem obscuridades, nem sequer a própria morte, porque na vida e na morte, desejo inteiramente, e em tudo, a vontade de Deus» (Diário, IV, 272). Assim, temos também a certeza de que a morte não é a última palavra, estamos fixos na vontade de Deus e assim, realmente, na vida para sempre.

Verónica revela-se, em particular, uma testemunha corajosa da beleza e do poder do Amor divino, que a atrai, permeia e inflama. É o Amor crucificado que se imprimiu na sua carne, como na de São Francisco de Assis, com os estigmas de Jesus. «Minha esposa — sussurrava-me Cristo crucificado — são-me preciosas as penitências que fazes por aqueles que estão em desgraça diante de mim... Depois, tirando um braço da cruz, fez-me sinal que me aproximasse do seu lado... E encontrei-me nos braços do Crucificado. Não posso descrever aquilo que senti naquele momento: queria estar sempre no santíssimo lado» (Ibid., I, 37). É também uma imagem do seu caminho espiritual, da sua vida interior: estar no abraço do Crucificado e assim permanecer no amor de Cristo pelos outros. Também com a Virgem Maria, Verónica vive uma relação de profunda intimidade, testemunhada pelas palavras que um dia ouve Nossa Senhora dizer, e que ela cita no seu Diário: «Fiz-te repousar no meu seio, recebeste a união à minha alma e por ela, como que em voo, foste levada diante de Deus» (IV, 901).

Santa Verónica Juliani convida-nos a fazer crescer, na nossa vida cristã, a união com o Senhor no ser pelos outros, abandonando-nos à sua vontade com confiança completa e total, e a união com a Igreja, Esposa de Cristo; convida-nos a participar no amor sofredor de Jesus crucificado pela salvação de todos os pecadores; convida-nos a manter o olhar fixo no Paraíso, meta do nosso caminho terreno, onde viveremos juntamente com muitos irmãos e irmãs a alegria da plena comunhão com Deus; convida-nos a nutrir-nos quotidianamente da Palavra de Deus para aquecer o nosso coração e orientar a nossa vida. As últimas palavras da Santa podem considerar-se a síntese da sua apaixonada experiência mística: «Encontrei o Amor, o Amor deixou-se ver!».

Bento XVI : Audiência geral da quarta-feira 15 de Dezembro de 2010.

sábado, 15 de janeiro de 2011

DIRECÇÃO ESPIRITUAL II

SOBRE A OBEDIÊNCIA

No primeiro artigo sobre direcção espiritual foi apresentado um texto do célebre livro “Imitação de Jesus Cristo”, livro que “cada um de nós deveríamos ter em cima da mesa de cabeceira”, como alguém disse, não para ocupar lugar, mas para ser lido.

O texto apresentado tratava da obediência, não de uma obediência cega ou masochista, mas aquela que permite progredir no caminho da perfeição. Todavia nem sempre é fácil obedecer, nem sempre é fácil se deixar admoestar por outrem, fosse este o maior doutor de ascética e mística, porque cada um de nós está sujeito a um inimigo feroz: o nosso Ego. Eis a razão porque no dito texto podemos ler: “Mas porque ainda te amas desordenadamente, por isso te repugna sujeitar-te de todo à vontade dos outros”.

Um dos maiores escritores sobre ascética e mística, foi sem dúvida o sacerdote francês Adolfo Tanquerey, cujo “Compêndio de ascética e mística” foi utilizado, antes do Concilio Vaticano II, em quase todos os seminários do mundo, diz que “um acto de obediência aos Superiores feito por um duplo motivo, por respeito pela autoridade, e ao mesmo tempo por amor de Deus que eles representam, terá um duplo mérito: o da obediência e o da caridade”. (§ 240-1)

Mas não é tudo, porque, diz o mesmo autor, “um acto de obediência e de humildade, a mais do valor próprio, recebe da caridade um valor muito maior, quando feito para agradar a Deus, porque assim se torna um acto de amor, quer dizer um acto da mais perfeita de todas as virtudes. Acrescentemos que este acto se torna mais fácil e mais atractivo: obedecer e humilhar-se custa muito à nossa natureza orgulhosa, mas ter consciência que praticando estes actos amamos Deus e procuramos a Sua glória, facilita-os singularmente.

Assim pois a caridade é não somente a síntese, mas a alma de todas as virtudes: ela une-nos a Deus de uma maneira mais perfeita e mais directa do que todas as outras; é portanto ela que constitui a essência mesmo de perfeição”. (§ 319-b)

Nunca pretendi ser “especialista” em direcção espiritual, nem teólogo: nada mais sou do que um “biscateiro” que procura ajudar naquilo que pode e onde pensa ter alguma utilidade. Se falo de direcção espiritual é porque é matéria que me interessa e porque me interessa procuro partilhar “com lealdade” e amor os poucos conhecimentos que possa ter. Se eles servirem a alguém, tanto melhor. Se algo disser que não seja justo, penso que aqui neste meio de comunicação existem numerosos sacerdotes, mais doutos do que eu, que poderão corrigir ou alertar para qualquer erro que eu possa cometer. A vida ensinou-me a ouvir os outros e a aceitar com humildade o que me dizem, mesmo quando isso magoa o meu pior inimigo: o amor-próprio.

Tomo, como se para mim fosse escrito, este conselho do Padre Tanquerey:

“Fazer progressos na obediência, é ao mesmo tempo fazer acto de humildade, de mortificação e de espírito de fé; é ao mesmo tempo adquirir a humildade e pela mesma ocasião se aperfeiçoar na obediência, no amor de Deus, na caridade, sendo o orgulho o obstáculo principal na prática destas virtudes”. (Padre Adolfo Tanquerey: “Compêndio de Ascética e Mística” § 468-b).

“Melhor é obedecer a Deus do que aos homens”, é uma verdade incontestável que não sofre qualquer contestação. Todavia, em matéria espiritual, ou melhor na direcção espiritual, existe uma alternativa muito particular, como podemos ver nas cartas da Beata Alexandrina ao seu Primeiro Director espiritual, que seguir transcrevo:

“Disse-me o meu amado Jesus que será Ele o meu Director e o meu Mestre contínuo, frequente, habitual, e V.R. lá de longe; mas que tenho que lhe obedecer primeiro do que a Ele”.

Ora, antes da beatificação, os escritos da Beata Alexandrina foram controlados por sete teólogos romanos e nenhum deles levantou qualquer protesto contra o que acabamos de ler, simplesmente porque assim é.

Tão estranho que possa parecer, esta é uma regra constante na direcção espiritual e comum aos Santos que beneficiaram de comunicações celestes, e cujos escritos podemos ler, tais como Santa Teresa de Ávila ou, mais perto de nós, Santo (Padre) Pio de Pietrelcina... e a Beata Alexandrina.
Afonso Rocha